Resumo:
Esta tese analisa alguns tópicos da naturalização da fenomenologia. Essa é uma tendência bastante recente no campo da filosofia da mente e das ciências cognitivas. Naturalizar a fenomenologia, ou a consciência, significa analisar os processos experienciais de objetivação, constituídos ou não por dados fenomênicos, por meio da ampla perspectiva metodológica do naturalismo. A análise que proponho neste trabalho parte da fenomenologia originária, isto é, utilizo majoritariamente conceitos elaborados por Edmund Husserl. Especialmente, considero a problemática da intersubjetividade e os seus conceitos correlatos como o de intencionalidade e intuição. Sua conhecida posição antinaturalista nos instiga a analisar os pressupostos de abordagens naturalizadas de conceitos fenomenológicos. Na tentativa de pensar a compatibilização das proposições
husserlianas com algumas propostas naturalizadas da consciência recorro principalmente a autores como Daniel Dennett e John Searle. Dennett realiza uma crítica nominal a Husserl, que é importante para a adequada caracterização do método fenomenológico como não introspectivo e que tem a intersubjetividade como um de seus estratos constitutivos. Além disso, Dennett também faz uso do conceito de intencionalidade vinculado à sua própria noção de fenomenologia naturalizada, o que nos permite ilustrar os conflitos com a consciência fenomenológica de Husserl. O intencionalismo de John Searle é significativo por possibilitar uma aproximação menos conflituosa, apesar de também tensional, com a definição husserliana de consciência e de intersubjetividade. Com base nesses aspectos, desenvolvo uma investigação conceitual da naturalização da
intersubjetividade a fim de indicar até mesmo em que medida a teoria fenomenológica da intersubjetividade pode ser relacionada ao debate sobre o problema das outras mentes. Este é um problema filosófico que persiste no campo da filosofia analítica da mente e é caracterizado não apenas como um problema epistemológico, mas também como um problema conceitual. Sob esses pressupostos considero as críticas de Husserl às epistemologias modernas, justamente das quais o vocabulário do mental e os seus problemas associados surgem, a fim de verificar em que medida a fenomenologia husserliana está “imune” aos principais problemas vigentes na filosofia da mente. Reflexiono os elementos conceituais que atualizam o naturalismo filosófico em relação ao que Husserl definiu como naturalismo na sua crítica fundacional, feita na virada do século XIX para o XX. Trato das proposições husserlianas sobre o problema da constituição do alheio e da objetivação de mundo, temáticas em que a intuição aparece como um componente indispensável, por estar presente em todo o desenvolvimento intencional dos vividos, portanto, em toda dinâmica de objetivação fenomenológica. Uma vez constatada a relevância conceitual da intuição para a fenomenologia husserliana, desenvolvo as implicações de uma completa naturalização da intencionalidade, na sua composição intuitiva, como elemento de externalização e de objetivação da consciência, por meio da expressividade e da manifestação. Minha proposta não é a de realizar uma análise puramente exegética das proposições husserlianas, compreendendo unicamente as funções internas de seus termos, mas a de trazer a fenomenologia para o diálogo com o ainda recente tema da naturalização da fenomenologia e os seus problemas adjacentes.