Resumo:
Na presente tese, estudamos as experiências de subjetivação política e suas reverberações no cotidiano de engajamento de mulheres que partilham da experiência
militante na Marcha Mundial de Mulheres (MMM), em Caxias do Sul. Para isso, conduzimos o nosso trabalho a partir das seguintes questões: as experiências de
dissenso em relação à localização social de ser mulher geram experiências de
subjetivação política? Se sim, de que forma essas experiências reverberem no
engajamento político cotidiano? Nesse processo, como se dá a mudança de si e do
entorno? Nesse ínterim, produzimos os dados de pesquisa por meio de entrevistas
compreensivas (KAUFMANN, 2013) com cinco mulheres militantes na MMM e
compartilhamento do tempo (FABIAN, 2006) na observação interativa das atividades
promovidas pelo grupo, no período de um ano. Orientamos a pesquisa com base nos
conceitos de experiência e cotidiano, discutidos, principalmente,por Thompson (1981,
2002, 2020) e Heller (2014), e nos conceitos de política, subjetivação e partilha do
sensível, fundamentados em Rancière (1996a, 1996b, 2005, 2014). Além disso,
refletimos sobre os princípios educativos dos movimentos sociais e sua potência
formativa para as pessoas militantes (GOMES, 2017; ARROYO, 2003). Organizamos
a tese de modo a dedicar um espaço narrativo para cada uma das entrevistadas, tendo
em vista que cada existência representa um modo de insurgir, de se colocar frente à
ordem política e social, ainda que na partilha de concepções comuns de mundo. Nesse ínterim, analisamos, por meio das entrevistas e da observação interativa, as experiências de (des)identificação, os tempos e espaços de subjetivação política e os aspectos do engajamento político de mulheres. Com isso, desenvolvemos na pesquisa nossa própria definição para o conceito de engajamento político. Consideramos que as participantes da pesquisa, na singularidade de suas trajetórias militantes, representam formas de existências insurgentes, ou seja, apresentam modos de viver que tem por princípio a resistência a diferentes opressões ligadas às suas localizações sociais e ao contexto sociopolítico que se inserem. Desse modo, defendemos a tese de que as experiências de dissenso em relação à localização social de ser mulher, na potência formativa da subjetivação política, geram mudança de si e do entorno que reverberam em engajamento político cotidiano. Concluímos que a diversidade nas trajetórias políticas estudadas demonstra que o engajamento em determinada causa não produz e não é produzido por pessoas homogêneas e não se traduz em fórmulas de emancipação. Ao reverberarem em suas relações familiares, laborais, de lazer, entre outros, a mudança de si, essas mulheres tensionam os sistemas de valores predominantes em seus meios, possibilitando a ocorrência de mudanças microssociais, sem necessariamente evidenciarem rupturas marcantes. Desse modo, elas atuam na transformação do cotidiano pela potência formativa da subjetivação política, na possibilidade de sonhar um sonho comum, uma utopia que as mobilizam a andarem juntas em uma direção, mas na vivência da singularidade de suas vidas.