Abstract:
No Brasil, as reflexões e ações sobre patrimônio tiveram seu germe e difusão ainda em princípios do século XX, com a implantação do IPHAN e ações, momento no qual o país vivia transformações intensas no cenário urbano e social. Nesse contexto, propomos identificar o discurso e práticas relativas à preservação patrimonial empreendidos pela arqueóloga franco-brasileira Niède Guidon, através de atuação no Parque Nacional Serra da Capivara, localizado no município de Coronel José Dias, integrante da macrorregião de São Raimundo Nonato, situado no semiárido do Estado do Piauí. Fundadora do Museu do Homem Americano, Niède Guidon se debruça sobre uma diversidade de achados arqueológicos no Piauí desde a década de 1960, descobrindo vários sítios arqueológicos e lutando por sua preservação, tanto por sua importância histórico-arqueológica quanto ambiental. Pretende-se assim, explicitar e compreender as ações e práticas educacionais referentes às questões patrimoniais e preservação do(s) acervo(s) que Niède Guidon e o grupo de pesquisadores (arqueólogos, professores e outros profissionais), sob sua supervisão, propõem para os habitantes das comunidades que vivem no entorno do Parque Nacional Serra da Capivara. Inserimos nossas análises das ações de educação patrimonial, na região que hoje é o Parque Nacional Serra da Capivara, entre as décadas de 1960 e 2010. Esse recorte temporal justificase por este ser um período em que a região passa a ser inserida em novas diretrizes educacionais sobre a catalogação, preservação e conservação dos bens patrimoniais, devido a chegada da equipe da Missão Francesa (1975) e a consequente criação do Parque Nacional Serra da Capivara, em 1979. Como contexto social, este trabalho abrange a área dos municípios piauienses de Canto do Buriti, Coronel José Dias, São João do Piauí e São Raimundo Nonato. O corpus documental analisado é formado por jornais, entrevistas, artigos, livros e revistas, resultando em análise de questionários quali/quantitativos colocados a professores e alunos de escolas próximas do Parque Nacional Serra da Capivara. Além disso, foi utilizada a trajetória de Niède Guidon como interlocutora privilegiada, por fazer parte de todo o processo de preservação e registro da área do Parque Nacional Serra da Capivara enquanto patrimônio cultural, e por representar a principal agente idealizadora das práticas de educação patrimonial, pesquisa e desenvolvimento da região, por meio dos trabalhos que desenvolve na Fundação do Homem Americano. No universo conceitual, que norteia o presente estudo, destacam-se os conceitos sobre patrimônio material e imaterial, educação patrimonial de autores como Françoise Choay, patrimonialização de Luchiari, de lugar social de Michel de Certeau, e de capital científico proposto por Pierre Bourdieu. Argumenta-se que, através das práticas de educação patrimonial propostas por Niède Guidon e o seu grupo, para as comunidades residentes no entorno do Parque Nacional Serra da Capivara, é possível a construção de identidades e o sentimento de preservação e conservação dos bens materiais e imateriais na região.