Resumo:
De uma colônia inicialmente sem maior importância, o Brasil tornou-se um dos protagonistas no novo cenário mundial. É preciso agora que essa evolução alcance o Direito Penal, com suporte na Constituição Federal de 1988. No entanto, é necessário conferir ao texto constitucional uma função transformadora, com destaque à busca da concretização de uma Constituição Dirigente (e Compromissória), passando pelas discussões em torno do neoconstitucionalismo, até alcançar o Constitucionalismo Contemporâneo. A mudança de um governo autoritário para uma democracia obriga a uma revisão de todo o sistema repressivo, especialmente o jurídico-penal, sem que se desconsiderem as necessárias reflexões acerca das influências da globalização, da sociedade do risco e da expansão do Direito Penal, ainda não suficientemente compreendidos. No que tange aos crimes de colarinho branco, existe uma grande polêmica em torno da sua definição, alternando correntes subjetivas (que levam em conta as características do agente), objetivas (com base no modus operandi) e mistas. A ideia de que os poderosos recebem um tratamento benevolente por parte da Justiça penal é tão frequente que a tarefa de justificá-la é muito mais complexa do que poderia parecer à primeira vista, sendo inclusive contrariada por algumas análises recentes. Para a investigação realizada na presente tese, foram usadas como parâmetro seis categorias de crimes com maior identificação em relação aos crimes de colarinho branco: crimes contra o sistema financeiro nacional, crimes contra a ordem tributária, crimes contra a ordem econômica, crimes licitatórios, crimes contra a ordem previdenciária e lavagem de dinheiro. Em relação ao processo de criminalização primária, constatou-se que a média de apenamento dos crimes de colarinho investigados (41,93 meses), é 61% superior à média dos crimes patrimoniais sem violência ou grave ameaça (25,94 meses), afastando um mito difundido no senso comum. Ademais, a legislação penal produzida após 1988, intencionalmente ou não, realiza uma consolidação jurídico-penal do conteúdo normativo da Constituição Federal, especialmente no que tange aos bens jurídicos supra-individuais vinculados aos colarinhos brancos, seja pelo número de leis criadas ou modificadas, seja pelas penas previstas. Da mesma forma, os projetos legislativos em relação à temática possuem a mesma tendência de incremento punitivo. No que tange ao processo de criminalização secundária, ganha especial destaque o COAF, que centraliza todas as comunicações, inclusive as previamente encaminhadas aos demais órgãos (BACEN, CVM, SUSEP e PREVIC). As operações realizadas pela Polícia Federal, em relação aos crimes de colarinho branco, aumentaram 1.500% entre os anos de 2003 e 2010. No entanto, entre 2006 e 2012, o número de inquéritos policiais instaurados pelo órgão foi reduzido em 60%. O Ministério Público não possui informações unificadas sobre denúncias oferecidas. Em relação ao Judiciário brasileiro, entre os anos de 2000 e 2012, não só os crimes de colarinho branco ensejaram um maior número de decisões nos tribunais pesquisados, como também resultaram em um número muito grande de decisões condenatórias, bastante superior ao de absolvições e extinções da punibilidade. A execução penal, no entanto, continua com o perfil de presos jovens, pardos, com grau de instrução baixo, e que cometem (principalmente) crimes contra o patrimônio.