Resumo:
No direito brasileiro, mesmo com um conjunto normativo atento às discriminações,
determinadas estruturas de subordinação como o racismo estrutural, o machismo
estrutural, a homotransfobia estrutural e as demais desigualdades étnicas e
aporofóbicas estruturais mantêm discriminações de forma persistente no cotidiano
social. Os estudos sobre o tema são desenvolvidos pela disciplina jurídica do direito
da antidiscriminação. Nela, são reunidas respostas para a realização do princípio da
igualdade e para uma definição da discriminação estrutural. Diante das limitações
teóricas para a proposição de seu conceito, as quais são restritas às descrições e
adjetivações atreladas a termos como “desvantagens”, “padrões” e “processos
sistemáticos de exclusão”, o objetivo desta tese é de valer-se dos aportes da
sociologia reflexiva de Pierre Bourdieu para propor-se a compreensão do fenômeno
da discriminação estrutural e avançar no seu conceito jurídico. Especificamente,
objetiva-se compreender o que estrutura a sociedade e a dominação, com base nas
categorias bourdiesianas, e analisar como a literatura jurídica tem enfrentado o
problema para ao final relacionar a sociologia reflexiva e o Direito; mediante a
concepção sobre o que estrutura a sociedade e a dominação, propor-se um conceito
jurídico de discriminação estrutural. Através de metodologia teórico-descritiva, o
método de abordagem utilizado é o hipotético-dedutivo tendo como métodos de
procedimento histórico, comparativo e tipológico, sendo a pesquisa dividida em três
partes. A primeira parte aborda os conceitos e as categorias sociológicas para a
compreensão sobre o que é estrutura social e dominação, valendo-se dos aportes de
Pierre Bourdieu em debate com outros estudos sociológicos sobre o tema, tais como
os vindos de Max Weber, Émile Durkheim, Karl Marx e Michael Foucault. Ainda são
abordados outros contrapontos, como os vindos da linguística estruturalista de
Ferdinand Saussure e da antropologia estruturalista de Lévi-Strauss para, ao final,
após a exposição crítica do referencial teórico de Bourdieu, demonstrar a sua
recepção no campo jurídico. A segunda parte estabelece um diálogo entre as
premissas sociológicas e os estudos jurídicos sobre discriminação estrutural,
expondo-se as potencialidades e as limitações no enfrentamento teórico sobre o tema;
tendo como referência os estudos relativos ao racismo estrutural e de outra parte
compreensões mais gerais sobre o tratamento dado às estruturas de subordinação, a
construção da legislação nas relações raciais e os movimentos sociais antirracistas
ao longo da história são abordados. Algo que se estende para outros vieses de luta
antidiscriminatória, como as discriminações estruturais por motivo de gênero e de
etnia, demonstrando-se as consequências decorrentes do sexismo, da colonialidade
e da homotransfobia. A terceira parte apresenta o conceito jurídico de discriminação
estrutural com base na sociologia reflexiva, relacionando-o com a sua aplicação na
dogmática jurídica e com as suas repercussões em outras categorias jurídica
antidiscriminatórias como nas discriminações direta, indireta e múltipla, na
antissubordinação, na legislação antidiscriminatória e nos precedentes
jurisprudenciais sobre os litígios estruturais. A tese defende que, fundamentado na
sociologia reflexiva, o conceito jurídico de discriminação estrutural pode ser definido
pelo conjunto de relações históricas que potencialmente causam e geram efeitos em
estruturas individuais e materiais introjetadas e externalizadas pelos agentes e grupos
sociais. Disso decorrem efeitos de dominação social estrutural/discriminações com a
submissão dos dominados/discriminados pelo poder e violência simbólica, conceito
apto a possibilitar medidas transformativas de dominações estruturais
discriminatórias.