Resumo:
Esta tese trata da possibilidade de inteligibilidade da narrativa cultural das paneleiras e seus parceiros, intercambiada entre os lugares de gestão do Ofício das Paneleiras de Goiabeiras. O saber-fazer panela de barro tradicional institucionalizou-se como ofício ao ser identificado, registrado e outorgado como o primeiro bem cultural de natureza imaterial registrado no Livro Saberes do Iphan. Da perspectiva do engajamento dos atores-artesãos na atividade paneleira, estas mulheres e homens realizam a confecção e a comercialização das panelas de barro. Neste movimento na lida com a argila, no galpão sede da associação e nas casas, no contato com o mangue e o bairro de Goiabeiras (Vitória-ES), as paneleiras estão imersas nas tensões e assimilações de construções identitárias pelas quais recriam relações familiares, de parentesco e vizinhança. Com intenção de pesquisarmos a abertura desta coletividade de artesãos e artesãs frente as suas parcerias institucionais, comunitárias, individuais e coletivas, formulou-se a seguinte questão: Quais os lugares da gestão do Ofício das Paneleiras de Goiabeiras e suas interações ao longo da relação cultura-ambiente para tornar inteligível o saber-fazer das paneleiras e de seus parceiros, implicado e articulado a atividade de produção, circulação e comercialização das panelas de barro pretas? Para situar esse estudo do ponto de vista teórico, percorremos considerações acerca de três eixos estruturantes do arcabouço investigativo pretendido para essa pesquisa: Narrativa cultural e suas dimensões patrimoniais; Percepção do “ser-no-mundo” entre o “mundo dos bens”; Comunidades de práticas e lugares de gestão de si e da coletividade. Do ponto de vista metodológico, persistimos na elaboração de etnografias dos sentidos e valores latentes, emergentes e manifestos a partir das lógicas de permuta dos lugares de gestão do Ofício das Paneleiras. O que exigiu delimitar as áreas de aproximação, problematização e assimilação e/ou resistência das “reservas” e “princípios de sentidos”, ressignificando ou tornando duráveis os regimes de valor perspectivados nos artefatos (artesanato), nas condutas e no ambiente da atividade paneleira. A noção de contexto ambiental entendida como âmbito de criatividade e interpelação da vida diversifica os registros de obrigações e as margens de atuação existentes na comunidade tradicional situada em Goiabeiras Velha. A participação legítima nesta instância do saber-fazer panela de barro é observada ao passo que se emaranham sentidos e valores no tempo de “maturação” das competências gerativas em estágio de desenvolvimento. Para tanto, mesmo sendo uma discussão aparentemente conflitiva tratar as paneleiras como “coletividade”, reconhecemos essa dimensão do coletivo de artesãos como potencialidade que interage e sofre relações de atores humanos e não humanos. A abordagem da epistemologia compreensiva perseguida neste trabalho viabilizou problematizar as possibilidades e limites das lógicas de permuta ambivalentes para a contração ou amplitude da inteligibilidade da narrativa cultural entendida como Ofício das Paneleiras de Goiabeiras.