Resumo:
Este é um estudo sobre a municipalidade e o governo da cidade no Brasil oitocentista. Tomando como objeto de análise a Câmara Municipal do Recife entre os anos de 1829 e 1849, traçamos um perfil da instituição e do grupo de vereadores eleitos e atuantes nela no período. A partir dos pressupostos teórico-metodológicos do elitismo, da prosopografia e da microanálise, e por meio de um variado e amplo acervo documental, remontamos as características e funções político-burocrático-administrativo-representativas do ente municipal e a trajetória, redes de alianças e atuação de 95 indivíduos que exerceram o cargo eletivo nele. Cotejando tal leitura com as perspectivas thompsonianas, apontamos que o exercício da administração municipal se dava a partir da lógica das relações paternalistas e clientelares, mas avançamos na análise, demonstrando também que ele era impactado pelos pressupostos ideológicos liberalizantes então vigentes. No limite, apontamos que a governança citadina era exercida entre as prerrogativas legais do Estado, os interesses da elite complexa que nela atuava e a interlocução com o cotidiano social. Nessa tríade, a Casa Local não era apenas um instrumento de dominação, mas também uma instância representativa com a qual a população poderia interagir e demandar suas necessidades cotidianas, participando, assim, do mundo governativo, dos destinos das elites dominantes e do processo de formação e consolidação do Estado liberal brasileiro na primeira metade do século XIX.