Resumo:
A pesquisa analisa o discurso humanitário no pós-Guerra Fria a partir de dois pressupostos teóricos fundamentais: a Teoria Crítica das Relações Internacionais de Robert Cox e a Teoria Crítica de Análise do Discurso de Norman Fairclough. A análise crítica proposta tem por objeto três documentos de padronização da ação humanitária internacional adotados pelo Comitê Internacional da Cruz Vermelha, Sphere Project e HAP (Humanitarian Accountability Partnership). Objetivando identificar nos documentos de padronização da Assistência Humanitária Internacional a representação textual de um discurso humanitário contemporâneo, a partir das premissas das teorias indicadas, a pesquisa procura também
identificar a estrutura discursiva dos documentos e seu caráter hegemônico e politizado.
Concebendo o discurso dialeticamente, como ação social que resulta e ao mesmo tempo
molda a ordem do discurso, conclui-se que há uma tendência na comunidade internacional em geral de conceber discurso contido nos referidos documentos e na ação humanitária por eles
regulamentada como moralmente inquestionáveis, rejeitando a hipótese de se questionar
ideias, instituições e condições materiais envolvidas nesses documentos e na prática
humanitária, de modo a indagar acerca da possibilidade de haver um projeto hegemônico na
estrutura histórica específica que se forma a partir das interações recíprocas desses elementos. Esse projeto hegemônico se esconde atrás dos princípios da neutralidade, imparcialidade e independência veiculados no discurso humanitário dos documentos analisados. A relação de poder que se manifesta na ordem desse discurso está velada no próprio discurso e por isso mesmo legitimada pela relação de poder que nele se contém. Do ponto de vista das Relações Internacionais, a análise crítica do discurso humanitário no pós-Guerra Fria permite desvendar as premissas não declaradas nesse discurso, de modo a identificar a ideologia nele impregnada e o projeto de poder nele amparado.