Resumo:
O presente estudo tem como objetivo analisar como os mitos sobre a origem do ser humano se fazem presentes em livros didáticos do 6º ano do Ensino Fundamental e que tensionamentos são produzidos entre os interesses de grupos religiosos relacionados a esses mitos e a função da escola na transmissão do conhecimento. Os aportes teóricos que lhe dão sustentação encontram-se, principalmente, nas contribuições de Inés Dussel e Walter Kohan acerca da função da escola, a partir do debate gerado com as ideias de Jan Masschelein e Marteen Simons. O material de pesquisa consiste em: a) documentos, que tratam direta ou indiretamente sobre a origem do ser humano, tais como projetos de lei, leis e decretos sobre o Ensino Religioso e, em alguns casos mais específicos, sobre o ensino do Criacionismo nas escolas; b) matérias jornalísticas e entrevistas que tratam desse tema e de experiências pedagógicas em escolas públicas e privadas, envolvendo o ensino do Criacionismo; c) treze livros de História destinados aos professores referentes ao 6º ano do Ensino Fundamental, que integram o Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) de 2017. A discussão desse material possibilitou problematizar a função da escola na transmissão do conhecimento, evidenciando a forte atuação da bancada religiosa do Congresso Brasileiro, da atualidade, no campo político. Essa bancada, de modo organizado, tem criado tensionamentos na instituição escolar, na tentativa de alterar o currículo escolar, para atender a seus interesses. A análise dos textos, imagens, exercícios e orientações destinadas aos professores mostra que os livros examinados privilegiam os conteúdos relacionados ao Evolucionismo, que é considerado como ciência, diferenciando-se das demais explicações, que são identificadas como mitos. O Criacionismo é abordado de modo secundário e é dado pouco (ou nenhum) destaque a outros mitos sobre a origem do ser humano. Os autores que abordam outros mitos, usualmente, os apresentam como curiosidades, ou como sugestões, para que sejam trabalhados pelos professores, demonstrando um encorajamento ao embate entre ciência e religião. A análise do material de pesquisa permitiu a identificação de uma atitude de resistência: a escola busca resistir às pressões externas que atuam principalmente por meio de movimentos religiosos organizados no campo político, visando introduzir conteúdos religiosos dentre aqueles a serem por ela transmitidos, e essa resistência está expressa nos livros didáticos.