Resumo:
O tema deste trabalho é a dinâmica das relações vinculantes e sua relação com a Felicidade. Desde a antiguidade, o tema é questão de discussões político-filosóficas e gerador de controvérsias. A premissa de que a felicidade individual está em sintonia com a felicidade de todos se articula com as políticas da modernidade, consolidando o sistema econômico vigente. Os estudos de sociedades anteriores à sociedade moderna e não ocidentais invertem essa maneira de conceber a relação indivíduo/sociedade. As escolhas individuais fazem parte de uma dinâmica de organização social de produção e reprodução da vida. Os vínculos sociais são o elo entre indivíduo e sociedade e a condição primordial para se ter uma boa vida. Diante dessa mudança paradigmática de conceber a natureza humana em movimento dialético com o coletivo, tomamos como referencial para a análise do fenômeno da felicidade os estudos antropológicos de Mauss sobre a dádiva e a tese de Polanyi de que a natureza do ser humano é social, e a economia, uma das dimensões da vida humana. Ao adotar como base esses autores, consideramos as formulações de seus seguidores para entender essa dinâmica da vida humana dentro das organizações sociais: a saber, Sabourin e seus estudos sobre a reciprocidade em Mauss e Polanyi, e a sistematização teórica de Gaiger sobre a qualidade das relações vinculantes. O conceito de felicidade que assumimos é de um sentimento que surge da articulação entre as condições objetivas e subjetivas. Sentimento, para Damásio, é a expressão que provém de uma sensação do corpo que se articula a uma percepção subjetiva dessa expressão corporal. O sentimento envolve o corpo e a alma, sendo visível na expressão de uma pessoa. Partindo desse referencial, adotamos o conceito de felicidade apresentado por Gaiger como um sentimento que surge de um estado de paz e bem-estar consistente, ancorado no que julgamos primordial à vida, à trajetória de nossas realizações e a uma avaliação global com a vida que temos e que levamos. Tomando como objeto empírico a Economia Solidária, buscamos fundamentos para a compreensão da felicidade a partir da teoria dos vínculos sociais que têm como base a concepção teórica sobre a dádiva de Mauss e a reciprocidade de Polanyi, utilizando as metodologias quantitativas e qualitativas. A partir das análises de questões das bases de informações do II Mapeamento e da pesquisa amostral dos(as) sócios(as) e sócias em Economia Solidária, demonstramos que os empreendimentos solidários são engajados e que os vínculos são motivadores para a entrada e permanência dos(as) sócios(as) nos Empreendimentos Solidários. Na pesquisa qualitativa, fizemos uma imersão no campo e entrevistamos 22 pessoas de quatro segmentos: seis agricultores familiares, sendo dois deles de comunidades quilombolas remanescentes; seis pescadores artesanais; quatro mulheres de uma cooperativa de alimentos e seis de uma cooperativa de catadores de materiais recicláveis. Concluímos que os vínculos são importantes para as pessoas estarem nas cooperativas bem como, tendo como vetor a reciprocidade, os vínculos podem transformar a autoimagem negativa em positiva, levando as pessoas a se avaliarem como felizes.