Resumo:
Este trabalho pretende sustentar a tese de que a relação entre ética e política no pensamento de Levinas desemboca num vínculo de interdependência e de conflito que conduz por fim a uma “tensão paradoxal”. Se, por um lado, a política necessita da ética para não ficar entregue a si mesma, evitando assim o constante risco de tirania, por outro lado, a ética sozinha não dá conta da justiça institucional, clamada pelo Terceiro presente no rosto do Outro, tornando a política igualmente necessária. No entanto, não deve haver entre política e ética qualquer tipo de derivação ou fusão. Não obstante, se considerado positivamente, o Estado deve perseguir a justiça; há assim uma espécie de aporia entre a administração da justiça através dos tribunais e o mandato ético de não outorgar sentido ao sofrimento essencialmente gratuito de outrem, exigido pela relação face a face. Perante esse cenário, parte-se da hipótese de que é implausível que, no conjunto da obra de Levinas, se possa estabelecer uma relação clara e definitiva entre ética e política. Porém, se defende a hipótese de que é legítimo pensar em dois grandes momentos no pensamento de Levinas em relação à política, a saber: no primeiro, que vai até Totalité et Infini, o destaque recairia numa perspectiva crítica da política; onde a relação é estabelecida em termos puramente negativos, pois política significa suspensão da ética; esta última, por sua vez, se formaria em oposição à política. Na segunda fase, que começa com o aparecimento de Autrement qu´être, se postula uma perspectiva construtiva da política, que possibilita a formação de um vínculo positivo com a ética através da figura do Terceiro. No confronto desses dois grandes momentos, pretende-se desenvolver a tese, qual seja: As relações entre ética e política na concepção da justiça perante o Terceiro em Levinas. A política deriva, em Levinas, da justiça ou do direito infinito do outro. O que, quanto à análise da relação do ético e do político em Emmanuel Levinas, implica a sua breve explicitação em dois compassos de um mesmo movimento. Conclui-se, então que a ordem estatal justa tem a ética como fundamento, ao mesmo tempo em que seu surgimento é dado pela insuficiência da própria ética. Tal Estado visa garantir a justiça ao terceiro e, com isso, corrigir a assimetria. Todavia, mesmo que o Estado seja justo, há um permanente e inevitável vácuo entre ética e política. Entre a invisibilidade (dizer) do rosto e sua visibilidade (dito): há um excesso aporético.