Resumo:
A idealização do Estado-razão na modernidade, como justificação teórica para a preservação da comunidade e o alcance do bem comum, encontra-se fortemente influenciada na crença acerca da legitimidade das ordens e comandos estatuídos pelas normas jurídicas e pelos indivíduos que estão nomeados para exercer a dominação. A implementação do Estado da social providência não se coaduna com o exercício da cidadania liberal-individualista de caráter fragmentário e mantenedor das desigualdades sociais. As dificuldades dos países semi-periféricos, como o Brasil, para a realização de um efetivo Estado Social de Direito deve ser revista a partir da correta inserção do ordenamento jurídico interno em um complexo sistema de globalização da economia e de dominação política dos países desenvolvidos. A imposição de uma racionalidade globalizante no plano internacional traz ínsita a concepção metafísica da universalização dos interesses, ocultando o aparecer das singularidades locais como forma de corrigir o rumo da instrumentalização do direito nacional às verdadeiras aspirações sociais. Mesmo na implantação da primeira jurisdição criminal universal da história da humanidade, criada para proteger os direitos humanos consagrados universalmente, os Estados dominantes não abriram mão de suas respectivas soberanias e institucionalizaram a seletividade da justiça criminal internacional e a relativização das sanções aos violadores dos direitos humanos. Já no plano jurídico interno, o paradigma racionalista transportado das ciências exatas para as ciências jurídicas norteou a busca idealizada da verdade ontologicamente inalcançável como um dos axiomas da instrumentalização (inautêntica) do Direito brasileiro. A investigação proposta parte do pressuposto que realmente todo conhecimento é de interesse social e destinado ao social, ainda que visto sob uma perspectiva individual, pois a ciência não deixa de ser uma prática social, na medida em que o conhecimento científico é realizado por um esforço social complexo para a compreensão da dinâmica de atuação dos atores sociais em determinada época e em determinado espaço social. Neste aspecto, para o alcance das metas sociais estabelecidas por uma agenda democrática, a análise dos fatores que legitimam o direito, ou a forma de fazer o direito, toma-se por base o conceito habermasiano do agir comunicativo como etapa dialógica indispensável para o alcance da democracia material. Após, é analisado o conceito de racionalidade do Estado proposto por Boaventura de Souza Santos na busca das chamadas soluções locais, na medida em que quanto mais local é o problema social apresentado, mais local deverá ser a solução proposta. A investigação proposta procura orientar-se nas bases da sociologia crítica para a compreensão acerca dos tópicos envolvendo a racionalidade jurídica, a legitimidade social do Direito e o papel do Poder Judiciário, reconhecendo-se a racionalidade local como condição epistêmica para o alcance das denominadas metas sócias emancipatórias para a formação de uma sociedade federativamente democrática.