Abstract:
O uso comum de terras é praticado por comunidades rurais em áreas sem cercamento,
utilizadas geralmente para a criação extensiva de caprinos e ovinos, maior fonte de renda dos moradores, bem como para o extrativismo e o beneficiamento de frutos (umbu, licuri,
maracujá do mato etc.). Essas áreas estão localizadas sobretudo no bioma Caatinga. Sua origem imemorial está relacionada à ocupação do interior baiano para criação extensiva de gado, no século XVI, a partir da concessão de imensas sesmarias às famílias D’ávila (Casa da Torre) e Guedes de Brito (Casa da Ponte). Monte Santo é um dos municípios com maior quantitativo de áreas utilizadas em comum na Bahia, com cerca de 40 áreas identificadas. O território de uso comum transcende os limites entre as comunidades e os municípios, visto que suas fronteiras abertas permitem aos animais pastorearem livremente e levarem consigo seus donos. O trabalho em questão se propõe a analisar a trajetória imemorial do uso de terras comunais, a institucionalização e o caso da comunidade de fundo de pasto Monte Alegre – Monte Santo (BA). Monte Alegre está integrada a esse contexto imemorial e luta desde os anos 1980 para reverter uma sentença judicial favorável a um parente que permitiu a este o domínio “legal” da área utilizada em comum pelos moradores. Nos anos 1980, essa modalidade de uso comum de terras vivenciou um processo de institucionalização empreendido pelo governo baiano, e, a partir deste, passaram a se autoidentificar como “fundo de pasto”, em detrimento de nomenclaturas locais e regionais tais como “bode solto”, “luta pela solta”, “terra livre”. A pesquisa tem como perspectiva teórica a História Social, ao apresentar como protagonista a história da “gente comum”. O cotidiano dos moradores de Monte Alegre se articula em prol do direito à terra, da manutenção do seu território e do direito de produção e reprodução da sua cultura. A comunidade, ao longo dos anos, foi constantemente ameaçada pelas ações do familiar e, mais recentemente, pela atuação de uma mineradora. Monte Alegre segue reafirmando seu direito imemorial às terras de uso comum e, através de uma rede construída com movimentos sociais, associação agropastoril, central regional e articulação estadual, tem se defendido mutuamente desses agentes que desrespeitam seu modo de vida e sua existência.