Resumo:
A distância entre o uso do pronome inovador a gente na língua falada e o emprego do mesmo na escrita é amplamente reconhecida. Há várias pesquisas voltadas para o uso de a gente na língua falada, porém, na escrita, o pronome em questão ainda tem sido pouco investigado, particularmente, sob uma perspectiva sociolinguística. Por esse motivo, o presente trabalho visa esclarecer o caminho de entrada do pronome inovador a gente na língua escrita, neste caso, através da produção literária destinada ao público infantojuvenil gaúcho. Dessa forma, pretendo mostrar se houve crescimento do pronome de primeira pessoa do plural a gente, ao longo das décadas de 70, 80 e 90, nos textos de literatura infantojuvenil produzidos no Estado do Rio Grande do Sul. Quanto aos escritores dedicados ao público já referido, ao todo, consultamos dez autores, a saber: Charles Kiefer, Cláudio Levitan, Diana Noronha, Jane Tutikian, Luís Dill, Lygia Bojunga Nunes, Marcelo Carneiro da Cunha, Moacyr Scliar, Sérgio Caparelli e Walmir Ayala. Dentre as várias metodologias de pesquisa possíveis para a análise e geração de dados, adotei, desde o início da pesquisa, o método de quantificação dos dados por possibilitar a comparação entre o novo pronome a gente e o pronome canônico nós no âmbito das variáveis linguísticas e sociais selecionadas para esta pesquisa. Somente assim será possível demonstrar se houve crescimento no que tange ao uso do novo pronome. Além disso, valho-me de trechos das obras consultadas a fim de servirem de exemplos dos casos evidenciados neste estudo. A análise está apoiada na Teoria da Variação e Mudança Linguística de Labov (1972) e leva em consideração a influência de fatores linguísticos e extralinguísticos no condicionamento das formas em variação. Os resultados gerais apontam para um uso efetivo do novo pronome a gente na literatura infantojuvenil gaúcha, como podemos constatar por meio dos resultados obtidos nas rodadas que foram realizadas com o auxílio do Programa Estatístico Varbrul. Verificamos os seguintes contextos linguísticos e extralinguísticos como sendo favorecedores para o uso de a gente na escrita das narrativas: (i) profissão do personagem, (ii) idade do personagem, (iii) tipo de narrador, (iv) classe social do personagem e (v) paralelismo formal. Esse quadro aponta que a mudança que introduz a forma inovadora no sistema pronominal encontra-se em um estágio muito avançado de gramaticalização na amostra de autores da literatura infantojuvenil gaúcha devidos aos altos percentuais e pesos relativos encontrados neste estudo. Por fim, os principais autores que contribuíram para a realização desta investigação foram: Borges (2004), Zilles (2007), Brustolin (2009) e Labov (1972).