Resumo:
A História proporciona, em certa medida, um relato da sociedade na qual se está envolvido no presente. É naquela que está a possibilidade de respostas a certas inquietações, sem que tais respostas transbordem da sua condição de respostas para a de soluções. Mas olhar a História é, com efeito, olhar a tessitura e os vários “textos” que a formam. Os vários “eventos” devem ser considerados nesse contexto. No correr da História, no tempo e no espaço do Ocidente, ela sempre foi vista como uma sucessão de etapas, etapas vistas como mudanças que, por sua vez, decorriam de escolhas e supressões. O posterior, se não moralmente, ideologicamente superior ao anterior. Para essa narrativa ser possível, mister uma estrutura conceitual filosófica que representasse e justificasse os valores envolvidos nas escolhas: a Filosofia. A partir da filosofia grega, constitui-se um esteio justificador que permeou todas as demais instituições, especialmente o Estado e o Direito. Efetivamente as escolha são feitas; o que predomina, porém, jamais se demite da sua experiência anterior, pois não há rigorosamente nada de originário. O evento, seja o Estado, seja o Direito, sempre está vinculado ao contexto. Um contexto de ações, atitudes, de cultura, em um sentido amplo, envolvendo todos os comportamentos, modos de pensar e agir do homem; envolvendo o ethos; isso é o originário. Na dinamização da cultura é que se pode observar o valor das ações. O valor atribuído a elas é o critério usado para se proceder às escolhas e configura, portanto, o núcleo ético-mítico no espaço e no tempo da civilização ocidental. Se desde sempre se está em um mundo de escolhas, desde sempre se está num mundo prático. A Filosofia no entanto, transformada em metafísica, esconde essa questão originária da escolha, ao cindir a razão e subordinando a razão prática à razão teórica, na medida em que esta fornece os elementos estruturais necessários (transcendentes) para a formulação dos juízos. Cindir a razão é uma escolha, vinculada a um modo de agir, a uma atitude, a um ethos. Isso está repercutido na forma como a História é considerada (etapas sucessivas e superiores) e na fundamentação filosófica do Estado e do Direito. O exemplo da Modernidade é eloquente, pois, a pretexto de superar o Medievo, recupera materiais da Antiguidade clássica, sem dar-se conta, no entanto, que o Medievo sequer rompera com a Antiguidade. Assim, é possível olhar a História não na linearidade da sucessão de fases e períodos, mas como um desdobramento cultural em espaço definido. Esse ponto de vista permite identificar nas manifestações políticas (Estado) e jurídicas (Direito) a natureza das escolhas a partir da fundamentação filosófica. Estado e Direito, em que pese serem conquistas (no sentido positivo) da civilização ocidental, conservam a originariedade do ethos civilizatório. O desvelamento é possível a partir da filosofia hermenêutica ou da hermenêutica filosófica. Retirar o véu encobridor das relações, não apenas revela os tantos problemas sociais, deixa implícita uma contradição: mantém-se um discurso que substitui a realidade (o uno) pela aparência (a igualdade entre o uno e outro) e a verdade, com efeito, é entregue à retórica, ao argumento. A hermenêutica filosófica não é normativa, mas apenas por meio dela é que se pode dizer que desde sempre se está na razão prática, desde sempre se faz escolhas, na História e na Linguagem.