Resumo:
A estrutura garantista do Direito Penal, forjada no Estado Liberal de Direito, cumpriu com brilhantismo o seu escopo no decorrer dos tempos, sendo portador de um conteúdo de intervenção máxima para algumas classes sociais e de um conteúdo mínimo para outras. Os direitos fundamentais ou princípios liberais desse ramo jurídico sempre buscaram legitimar e, consequentemente, afastar a essência da discussão concernente a atuação do Direito Penal como um eficiente instrumento de controle social, criminalizando comportamentos inerentes aos indivíduos desprovidos das condições de possibilidade para integrarem materialmente o mundo capitalista, assim como fundamentar a ilegitimidade do mesmo para intervir em face às condutas praticadas pelos indivíduos inseridos no sistema capitalista. Não há dúvida de que, no Estado Liberal de Direito, o Direito Penal liberal exerceu papel imprescindível na efetivação de direitos e garantias fundamentais de primeira dimensão. A indagação que deve ser respondida é: A quem e para quem tem servido o Direito Penal? O Estado Social de Direito no Brasil ainda não foi vivido de modo efetivo. Um rol extenso de direitos fundamentais sociais não passou de uma promessa vazia, de um sonho não vivido. A sociedade mudou, o mundo mundou. A sociedade atual caracteriza-se por uma intensa complexidade, na qual a criminalidade se modernizou, novos interesses relevantes surgiram, enfim, as características da atualidade são completamente diversas das características do momento histórico em que se estruturou o Direito Penal liberal ou garantista. Por que o Direito Penal deve permanecer atrelado ao paradigma liberal-individualista e não deve modernizar-se, adequando-se à nova sociedade para buscar combater com eficiência a nova criminalidade? Entendemos que o Direito Penal extrai sua legitimação não na teoria do bem jurídico, mas sim na teoria da prevenção geral positiva, isto é, a função a ser exercida pelo Direito Penal seria negar a negação gerada pelo comportamento infrator da norma, restabelecendo a validade e a credibilidade da mesma, atuando, portando, contrafaticamente. Em uma sociedade complexa, deve o sistema jurídico-penal contribuir para reduzir a complexidade social. Para que ocorra a modernização ou expansão do Direito Penal, se adequando às peculiaridades da sociedade e da criminalidade na atualidade, torna-se necessária a limitação de determinados direitos e garantias fundamentais individuais. Tal limitação sempre pautada pelos postulados normativos da proporcionalidade e da razoabilidade, tendo sempre como parâmetro o ganho que será conquistado na efetivação de outros direitos e garantias fundamentais, porém, na atual quadra da história, de conteúdo social. Não compactuamos com a supressão de direitos e garantias fundamentais individuais, mas sim, valendo-se dos postulados da concordância prática, da unidade da Constituição, proporcionalidade e razoabilidade, da realização de uma moderna, atual e necessária releitura dos direitos e garantias fundamentais individuais, cotejando as mesmas com a também necessária efetivação do direito fundamental a segurança pública, assim como com a efetivação de inúmeros outros direitos fundamentais sociais. O combate eficiente aos crimes de colarinho branco, contra a ordem econômica e tributária, crimes empresarias e outros, contribuirá para a efetivação de direitos fundamentais de quais classes sociais? Por que tanta resistência no reconhecimento da legitimadade da modernização ou expansão do Direito Penal? Os direitos e garantias fundamentais previstos no texto constitucional significam principios constitucionais e, portanto, em uma sociedade plural e complexa como a atual, é frequente a ocorrência de colisão entre princípios. No tema modernização ou expansão do Direito Penal a essência da discussão é a colisão entre direitos e garantias fundamentais individuais e direitos e garantias fundamentais sociais. A legitimidade ou a ilegitimidade da modernização do Direito Penal deverá ser inferida no caso concreto, tendo como método de aferição o Procedimento da Ponderação desenvolvido por Robert Alexy, assim como os postulados normativos aplicativos da proporcionalidade e da razoabilidade. É imprescindível que o Direito Penal supere o paradigma liberal-individualista, altere seu instrumental material de combate à criminalidade, contribue decisivamente na efetivação de direitos fundamentais sociais, resgate a credibilidade da vontade geral contida na norma violada e reduza a complexidade da sociedade atual. Em qual sociedade queremos viver? Quais os objetivos da República Federativa do Brasil?