Resumo:
Genericamente, a deficiência intelectual é tomada como uma condição de limitação no funcionamento intelectual. A constatação sobre essa limitação é realizada mediante a observação atenta daquilo que o indivíduo manifesta por meio da linguagem. Entre a manifestação, a observação e a constatação, portanto, a concepção de linguagem do avaliador é um aspecto nevrálgico para o processo de interpretação dos dados. Em geral, no entanto, esta não parece ser uma preocupação no estudo da deficiência intelectual, área em que comumente as diferentes concepções sobre a linguagem se intercalam. Este trabalho defende que, numa perspectiva socioecológica (cf. SCHALOCK et al., 2010), a conceituação da deficiência intelectual depende de uma concepção interacionista de linguagem. Sendo assim, busca apresentar uma proposta de compreensão de dados de linguagem que indique elementos que contribuam para o estudo desse fenômeno. As reflexões apresentadas orientam-se desde as principais teses do interacionismo sociodiscursivo (ISD), em razão de ser esta uma abordagem que toma a linguagem como o principal instrumento de desenvolvimento humano (BRONCKART, 2006). Em uma sala de recursos multifuncionais, foram realizadas interações com um jovem com síndrome de Down, utilizando um jogo digital. Esses dados foram gravados e transcritos, a fim de serem discutidos a partir dos modelos de análise de ação de linguagem e da arquitetura textual, propostos pelo programa do ISD (BRONCKART, 1999[1997]). A análise sugere que, juntamente com os dados que registram aquilo que é manifestado pelo indivíduo, devem ser considerados os parâmetros do contexto em que ocorrem, bem como a atividade conjunta do mediador. Observando a construção dos textos orais do jovem participante da pesquisa, verificou-se a manifestação de um domínio insatisfatório das capacidades de linguagem, em relação ao manuseio dos mecanismos de composição textuais. Porém, simultaneamente, foi percebido que a atividade conjunta do mediador, utilizando estratégias interacionais (GRÀCIA; VILASECA, 2008) por meio da linguagem, ampliou as capacidades manifestadas pelo jovem, promovendo o desenvolvimento. Essas constatações apontam para a importância de se considerar a linguagem no centro do desenvolvimento humano, sobretudo, ao se investigar a problemática da deficiência intelectual.