Resumo:
A dependência de substâncias é um dos problemas mais graves e complexos de saúde pública, reconhecida mundialmente. A necessidade de desenvolvimento de tratamento é fundamental e deve levar em conta diferenças entre os sexos no que diz respeito à depressão e à ansiedade, à motivação para a mudança do comportamento problema e à fissura (craving) pelo crack. Para tal, conhecer as características e especificidades do dependente químico é essencial para o desenvolvimento de medidas efetivas de prevenção e intervenção. Esta dissertação de mestrado está organizada em dois artigos empíricos. O primeiro artigo apresenta os resultados do perfil sociodemográfico de homens e mulheres dependentes de crack internados para desintoxicação nos sistemas de saúde público e privado. Participaram 159 adultos (80 homens e 79 mulheres), com idades entre 18 e 60 anos, com média de 30,7 anos (DP=8,54). Dos participantes, 99 (62,3%) estavam internados em duas instituições públicas, e 60 (37,7%) em uma instituição privada, localizadas em Porto Alegre, RS, Brasil. A média de idade para a primeira situação de consumo de crack foi de 24 anos (DP=8,6). Os instrumentos utilizados foram uma entrevista sociodemográfica e padrão de consumo de substâncias psicoativas e o Mini International Neuropsychiatric Interview (M.I.N.I. Plus). Os resultados identificaram vulnerabilidades em ambos os sexos e em ambas as instituições, no presente estudo, nas seguintes variáveis: escolaridade, renda familiar, doenças diagnosticadas, uso de drogas lícitas e/ou ilícitas na família, motivos do consumo de crack, frequência do consumo de pedras de crack no início do uso e antes da internação, recursos para obtenção do crack, locais de tratamento, processo penal e ato infracional. Os dados indicam a importância de conhecer o perfil do dependente de crack, delineamento este que pode contribuir para o planejamento de programas preventivos em relação ao uso e abuso de substâncias psicoativas. O segundo artigo empírico teve como objetivo verificar os sintomas de ansiedade e depressão, avaliar a fissura pelo crack e identificar a motivação para mudança do comportamento, caracterizando as diferenças entre adultos do sexo feminino e masculino dependentes de crack internados para desintoxicação em instituições públicas e privadas. Os instrumentos utilizados foram o Inventário de Ansiedade de Beck (BAI), Inventário de Depressão de Beck (BDI-II), Cocaine Craving Questionnaire-Brief (CCQ-B) para o Crack, Escala URICA (University of Rhode Island Change Assessment) e Régua de Prontidão para Mudança. De acordo com os resultados, a amostra (N=159) apresentou sintomas de ansiedade moderada; sintomas de depressão mínima; fissura pelo crack moderada; encontrava-se no estágio de pré-contemplação e manutenção em relação à motivação para mudança do comportamento aditivo, no entanto, quando investigado o escore de prontidão para mudança, a amostra apresentou-se desmotivada em relação à mudança do comportamento, ao passo que, na Régua de Prontidão para a mudança mostrou vontade de mudar e confiança para alcançar a mudança. Observou-se uma frequência maior de casos graves de ansiedade no sistema público e maior frequência de mulheres com ansiedade grave no sistema público. Verificou-se que os principais preditores de prontidão para mudança (URICA) foram: em relação ao sexo, feminino; ao local de internação, instituição privada; e que não tenham vivenciado perdas significativas no decorrer da vida. Esses achados sugerem que o sexo tem relevante papel na dependência química, visto que apresentaram diferenças estatisticamente significativas no que se refere à ansiedade e à motivação para mudança do comportamento. Estes resultados confirmam a necessidade de mais pesquisas envolvendo as questões investigativas entre homens e mulheres na dependência de crack e outras substâncias psicoativas.