Resumo:
A ideia de se transformar resíduos em matéria prima tem produzido esforços no sentido de estudá-los e qualificá-los, já que o aproveitamento integral de resíduos é uma necessidade cada vez maior na indústria moderna, principalmente pela crescente escassez de recursos naturais não renováveis e a necessidade de preservação e recuperação do meio ambiente. O resíduo cinza de casca de arroz (CCA), resultante da queima da casca de arroz para geração de energia, vem sendo utilizado em diversos ramos industriais. Destaca-se sua aplicação na construção civil e também como material adsorvente. A CCA utilizada neste trabalho está misturada com carvão ativado (CA). Esta mistura é proveniente de filtros de adsorção de sistemas de remediação de áreas degradadas com hidrocarbonetos de petróleo. Com isto, o objetivo deste trabalho foi avaliar a solidificação/estabilização de hidrocarbonetos de petróleo, em especial, benzeno, tolueno, etilbenzeno e xileno (BTEX), contidos no adsorvente composto por CCA e CA, em matriz de cimento Portland. Para tal, foram confeccionadas argamassas com substituição do agregado natural, em volume, pelos seguintes materiais: resíduo, nos teores de 10% e 30%, adsorvente CCA/CA in natura no teor de 30% e adsorvente CA in natura, também no teor de 30%. Essas argamassas foram caracterizadas ambientalmente, através dos ensaios descritos nas Normas Brasileiras. Analisou-se também a influência dessa substituição, através da determinação de propriedades no estado fresco (evolução da temperatura semi-adiabática de hidratação, penetração de cone e tempo de pega), de propriedades mecânicas (resistência à tração na flexão e à compressão) e caracterização dos produtos de hidratação através das técnicas de difração de Raio-X e espectroscopia de infravermelho. A argamassa RESÍDUO 10% atingiu a maior temperatura e menor tempo entre o início e fim da evolução da temperatura devido à hidratação. Já a argamassa RESÍDUO 30%, ao contrário, apresentou o maior tempo, fato justificado pela ação do óleo, presente no resíduo incorporado, que impediu, em parte, a passagem da água, retardando o processo de hidratação. Todas as argamassas, em relação a REFERÊNCIA, apresentaram menor consistência, na penetração de cone, e menor tempo de início e fim de pega. Resultados estes que corroboram, para as argamassas RESÍDUO 10%, CCA/CA 30% e CA 30% com a evolução da temperatura semi-adiabática da temperatura. A incorporação do resíduo não interferiu na formação dos compostos de hidratação do cimento, porém, a hidratação, conforme os resultados obtidos na evolução da temperatura semi-adiabática, ocorreu mais lentamente com a substituição de 30% da areia natural pelo resíduo. Os resultados da espectroscopia de infravermelho sugerem a presença BTEX nas argamassas RESÍDUO 30% e RESÍDUO 10%. Carbonatos e silicatos também foram identificados em todas as argamassas. Quanto aos resultados de resistência mecânica, observou-se, na resistência à tração na flexão, que a diferença entre o maior e menor desempenho, entre as argamassas REFERÊNCIA, RESÍDUO 10% e RESÍDUO 30%, foi de 8,9% e 5,6% para 7 e 21 dias, respectivamente. Já na resistência à compressão, aos 7 dias, os resultados obtidos das argamassas RESÍDUO 10% e RESÍDUO 30% foram superiores ao de REFERÊNCIA. Aos 21 dias, a REFERÊNCIA apresentou o melhor desempenho, 31,7% e 52,5% superior à argamassa RESÍDUO 30% e RESÍDUO 10%, respectivamente. Com os resultados de resistência mecânica obtidos, não foi possível avaliar a melhoria de desempenho com relação à idade. Porém, observou-se que a contaminação presente contribuiu para a resistência das argamassas, quando comparadas a CCA/CA 30%. Logo, sugere-se que a presença do contaminante possivelmente contribuiu quanto à aderência entre as partículas da mistura. Na caracterização ambiental, as argamassas confeccionadas foram classificadas como Classe II A, resíduo não perigoso, não inerte. A análise do extrato lixiviado e solubilizado das argamassas RESÍDUO 30% e RESÍDUO 10% não identificou a presença de hidrocarbonetos de petróleo. Estes resultados, associados à espectroscopia de infravermelho, às propriedades mecânicas bem como ao odor característico dos corpos de prova, confirmam a s/s do contaminante na matriz de cimento Portland. Este resultado positivo representa um avanço na busca da viabilidade de se empregar o resíduo CCA/CA contaminado com hidrocarbonetos de petróleo, direta ou indiretamente, para algum fim comercial.