Resumo:
Valendo-se do arcabouço teórico da análise da fala-em-interação (SACKS, 1992; SACKS; et al., 1974; C.GOODWIN, 1984) e da etnometodologia (GARFINKEL, 1967), este estudo etnográfico (O´REILLY, 2009) objetivou compreender como duas famílias, nomeadas como família de Catarina e família de Mila, e pertencentes a classes sociais distintas, significam suas responsabilidades vinculadas ao domínio escolar dentro de casa ao participar da rotina escolar das crinanças. Responsabilidade origina-se do caráter responsivo de nossas ações (HILL; IRVINE, 1992), que a qualifica, portanto, como intersubjetiva (OCHS; IZQUIERDO, 2009). Os resultados apontam orientações distintas em cada família, as quais nomeio como de responsabilidade compartilhada e de responsabilidade partilhada. Na responsabilidade compartilhada, evidencia-se a centralidade da criança e de seu universo escolar cotidiano, na conarração das experiências escolares da criança, na coconstrução do entendimento sobre o mundo escrito, e na oferta de roteiros (EMMISON et al., 2011) de ação futura pelos adultos. Além disso, adultos compartilham com a escola os fazeres pedagógicos de mediar o conhecimento, através de sequências IRA (COULTHARD; SINCLAIR, 1975; GARCEZ, 2006), constituindo escola e família como extensão uma da outra (CARVALHO, 2004). Responsabilidade partilhada, por outro lado, aponta para busca pela autonomia da criança com relação aos seus afazeres escolares e para a distinção entre a natureza social da escola e da família através da distribuição e manutenção das responsabilidades de cada membro familiar no que tange à escola, na negociação explícita de responsabilidade (FINCH; MASON, 2006) e na fulcral distinção entre narradora e plateia nos eventos narrativos da experiência escolar. As análises também evidenciam o constituição generificada da responsabilidade paternal pelo trabalho invisível de organização das tarefas escolares domésticas (REAY, 2005) na família de Catarina, e da mãe como gatekeeper (GOTTZÉN, 2011) da participação paterna na família de Mila. Esse trabalho generificado desestabiliza discursos normativizados sobre a participação paterna, especialmente em classes sociais menos privilegiadas, nas quais os pais são vistos como gerentes da rotina familiar apesar do número crescente de famílias chefiadas, financeiramente, por mulheres (FONSECA, 2004). O estudo contribui com os estudos sobre a participação familiar na trajetória escolar das crianças propondo que participação é intrínseca à noção familiar de responsabilidade, posicionando a escola como uma tarefa a ser cumprida ou como um direito a ser garantido à criança.