Resumo:
Alguns fatores contribuem significativamente para a precarização da organização do
trabalho na fumicultura, destacando-se: a exploração do produtor de tabaco pela
empresa fumageira; a desproteção social destes trabalhadores pelo Estado; a intensificação do trabalho em consonância com a lógica de acumulação de capital,
colocando em risco a saúde dos profissionais; a proposta de diminuição do plantio e do
consumo do tabaco em todo território nacional. Resistindo a estas adversidades, os
produtores de fumo procuram sobreviver em um cenário econômico que não lhes é
favorável. Esta pesquisa objetivou conhecer a percepção destes profissionais acerca do
reflexo da organização do trabalho sobre suas vivências de prazer e sofrimento no
trabalho. Participaram desta investigação 15 fumicultores, homens e mulheres que
desenvolvem o cultivo do fumo como sua principal fonte de renda. Todos os
participantes são munícipes de Dom Feliciano/RS, cidade referência nacional no cultivo
do tabaco. A pesquisa foi desenvolvida conforme o método exploratório descritivo, a
partir de uma perspectiva qualitativa, sendo o instrumento de pesquisa empregado a
técnica de grupos focais. Um roteiro de questões norteadoras, elaborado de acordo com
os pressupostos teóricos da Psicodinâmica do Trabalho e com a revisão bibliográfica
sobre o tema, auxiliou a pesquisadora na condução dos encontros. Para a análise
interpretativa, optou-se pelo modelo misto proposto por Bardin, tendo sido
estabelecidas categorias a priori e a posteriori, estas para contemplar, inclusive, os
conteúdos inéditos emergidos nos grupos. Esta Dissertação apresenta e discute, em dois
artigos empíricos, os resultados obtidos nesta pesquisa. A primeira sessão expõe o
artigo intitulado “O fumicultor adverte: a causa do seu sofrimento é o homem, não o
fumo”, tendo como principais achados o sofrimento experimentado pelos fumicultores
em decorrência da organização alienante do trabalho e da ansiedade destes profissionais
frente à ameaça do desemprego em massa, obrigando-os a considerar alternativas de
fonte de renda, como a diversificação rural, o que, ao seu julgo, não lhes favorece. Os
produtores de fumo retratam a situação que o Homem os coloca, sendo este
representado, em sua ótica: pelas empresas fumageiras, pelo Estado, e pelos próprios
fumicultores, que não mobilizam-se de forma efetiva para impedir a injustiça social que
acomete sua classe profissional. Na segunda sessão, apresenta-se o artigo intitulado
“Não adoece só quem fuma, mas também quem planta”. Este aponta que o desprazer e o
sofrimento são vivenciados diariamente pelos fumicultores e pouca menção se faz ao
prazer no trabalho e aos raros momentos de lazer. O sofrimento e o adoecimento são
decorrentes da precarização das condições de trabalho, causados, principalmente, pela
intensificação deste. Entretanto, é comum o fumicultor se culpabilizar pelos agravos a
sua saúde, admitindo cometer excessos e não tomar as precauções necessárias para
evitar o adoecimento. O entendimento destes trabalhadores, acerca das consequências
da exploração de que são vítimas, é limitado. Estes agricultores não compreendem que
os “erros” e “exageros” que percebem cometer, são reflexos de uma organização do
trabalho alienante. Almeja-se, com esta investigação: atentar para a importância da
participação efetiva dos fumicultores nos espaços públicos de discussão sobre a
proposta de diversificação rural; esclarecer a relação de dominação entre os
fumicultores e as empresas fumageiras; contextualizar a emergência da intervenção do
Estado para garantir os direitos à saúde e previdenciários dos trabalhadores rurais;
possibilitar aos profissionais de saúde mental, conhecer a perspectiva dos fumicultores
quanto ao seu sofrimento e adoecimento, favorecendo o entendimento de que os agravos
que acometem estes agricultores, não devem ser resumidos a uma descrição de sintomas ou diagnósticos, mas prevenidos, problematizados como um problema social que exige a interlocução de diversas áreas do conhecimento.