Resumen:
Esta dissertação buscou compreender como ocorre a prática de um jornalismo feminista tomando como objeto o Projeto Celina, uma iniciativa do jornal O Globo, criado em 2019, destinado à cobertura de temas ligados a gênero, mulheres e diversidade. O objetivo, portanto, era entender se e em que medida os feminismos das jornalistas do projeto eram acionados na cobertura sobre violência de gênero – fenômeno entendido, por mim, como uma das principais consequências das desigualdades de gênero –, levando em consideração que a iniciativa é alocada em um jornal tradicional e reconhecido por um discurso conservador. Para alcançar tal objetivo, a pesquisa parte do entendimento de gênero como uma categoria teórico-epistemológica (BONETTI, 2012) e do jornalismo como uma instituição pedagógica e um tipo de conhecimento social, que é, em si, marcadamente masculino (VEIGA DA SILVA, 2014). O estudo se encaminha a partir de dois vieses metodológicos: a análise da narrativa (MOTTA, 2017), aplicada às notícias sobre violência de gênero veiculadas no primeiro ano de funcionamento do projeto; e a realização das entrevistas com algumas das jornalistas de Celina. Esses dois métodos buscaram uma análise mais abrangente sobre a prática jornalista do Celina, colhendo pistas dos interesses comunicativos expostos nas narrativas e também o entendimento das jornalistas em relação a gênero e feminismo. Com isso foi possível perceber que, mesmo que as jornalistas proponham uma cobertura feminista no projeto e que de fato consigam romper com algumas normas profissionais masculinistas e hierarquizantes, o compromisso com a objetividade acaba se apresentando como um dos principais obstáculos nesse jornalismo feminista que seria mais afeito à subjetividade, à parcialidade e à alteridade. Essa objetividade também se mostrou como uma conduta que acaba limitando a abertura das jornalistas com sujeitos e realidades distantes das delas, seja na proposição das pautas ou no próprio desenvolvimento destas. Mesmo que haja um esforço em abranger as pautas do feminismo interseccional, considerando as desigualdades de gênero em relação aos outros marcadores sociais, as jornalistas de Celina, ao negar as suas subjetividades e os seus ativismos nas notícias que veiculam, acabam legitimando apenas as vozes de algumas mulheres e apenas alguns tipos de violência de gênero, que estão mais próximas delas enquanto sujeitas.