Resumen:
Nosso propósito nesta dissertação é, a partir da teoria das tragédias presente na Poética, de Aristóteles, aprofundar as inter-relações entre o conceito de katharsis e a natureza ético-cognitiva das pathé (emoções) propriamente trágicas de piedade (eleos) e medo (phobos). Afirmamos que o papel conferido a essas emoções, tomando o modo como são suscitadas pela estrutura do mythos (enredo) da tragédia, possibilita uma espécie de “clarificação” perceptiva relativa à compreensão de valores práticos. Examinamos, inicialmente, as teses de Gerald Else e Leon Golden, assim como a teoria da katharsis como consta no diálogo Sofista, de Platão. A atenção foi concentrada na segunda e terceira teses, tidas como o status quaestionis sobre a relação investigada, resultando, no posicionamento frente a elas, como um objetivo secundário desta pesquisa. A fim de oferecer uma interpretação específica a respeito da katharsis, argumentamos que o sentido do termo demanda a compreensão sobre a natureza ético-cognitiva da piedade e do medo com base na Retórica e na Ética a Nicômacos. Enquanto elementos complexos que exigem juízos e crenças específicas sobre o mundo, tais emoções são engendradas racionalmente no mythos (enredo) do drama de cunho trágico, de modo a suscitar, no público, determinadas reações. Levando em conta que, para suscitar as emoções trágicas, é preciso 1) apresentar pessoas de bom caráter, 2) mostrá-las passando de boa para má fortuna, aprofundamos essa investigação no último capítulo com base em exemplos de conflitos morais na Antígona, de Sófocles. Por meio do exame de casos particulares de deliberação e resposta afetiva, destacamos 1) que o fator que contribui para a avaliação moral do personagem é sua resposta adequada a determinadas situações de conflito envolvendo não apenas apreciação intelectual, mas, quando for apropriado, reação emocional. A adequação das respostas do personagem à deliberação, determina o seu caráter, este que é central para nossa resposta propriamente trágicas de piedade e o medo. 2) Ao mostrar pessoas de bom caráter passando de boa para má sorte, a tragédia, por meio da piedade e do medo suscitados, nos “clarifica” sobre a vulnerabilidade eudaimonística humana em sentido aristotélico.