Resumen:
O papel de predadores na estruturação de comunidades é bastante estudado em grupos como vertebrados e aranhas, enquanto o papel de outros predadores de reconhecida importância, como as planárias terrestres, é pouco conhecido. Planárias terrestres formam um grupo diverso de platelmintos terrestres, especialmente em regiões tropicais, e são carnívoras, em sua maioria predadoras, mas sua grande sensibilidade a alterações ambientais as torna difíceis de serem mantidas em laboratório, o que reduz o número de estudos sobre seu comportamento. Por exemplo, os hábitos alimentares da maioria das espécies, incluindo a composição de sua dieta e seu comportamento predatório, são desconhecidos. Devido à relevância de estudos sobre a ecologia trófica de planárias terrestres para o adequado manejo de suas populações, este trabalho foi desenvolvido de maneira a enriquecer o conhecimento sobre as diversidades morfológica, fisiológica e comportamental das planárias terrestres em relação a sua dieta e seu comportamento predatório. Para facilitar a identificação de itens alimentares sem a necessidade de ofertas exaustivas de diversas possíveis presas, comparamos variáveis morfológicas de planárias de diversas espécies aos hábitos alimentares conhecidos. Os resultados indicaram que a espessura da musculatura cutânea é uma variável mais importante para determinar a dieta de planárias terrestres que a anatomia da faringe, sugerindo uma maior diversidade na adaptação morfológica para a captura e menor para o consumo. Em uma espécie de hábitos alimentares mais generalistas, que inclui tanto gastrópodes quanto outras planárias em sua dieta, examinamos a influência de diferentes dietas sobre a sobrevivência, o crescimento e a fecundidade. Espécimes que receberam uma dieta mista (planárias + lesmas) sobreviveram em média menos tempo que espécimes que se alimentaram apenas de planárias ou apenas de lesmas. No grupo misto, houve preferência por planárias. Não houve diferença significativa no crescimento entre os grupos. O maior número de cápsulas de ovos foi depositado por espécimes se alimentando apenas de lesmas, mas o grupo de dieta mista depositou cápsulas mais pesadas. A constante alternância entre diferentes itens alimentares parece ter efeitos negativos sobre as planárias, sugerindo a necessidade de grandes alterações fisiológicas para digerir diferentes presas. As cápsulas mais pesadas depositadas pelo grupo com a menor sobrevivência sugere investimento terminal, com aumento do investimento em reprodução ao final da vida. Por fim, examinamos o comportamento de detecção de presas e o comportamento de reconhecimento de predadores em uma planária terrestre que se alimenta de isópodes terrestres e é predada por outras planárias terrestres. A planária não foi capaz de detectar sinais químicos e mecânicos da presa à distância e não seguiu rastros químicos de presas, sugerindo um comportamento de emboscada para a captura de presas. Ao toque direto com predadores, a planária apresentou imediata resposta de fuga, a qual não ocorreu ao toque com não predadores. Espécies filogeneticamente próximas de predadores, mas que não são predadoras da planária, também desencadearam a resposta de fuga, sugerindo assinaturas químicas similares que não são distinguíveis pela planária. Secreções e rastros químicos do predador por si sós raramente desencadearam respostas de fuga, indicando a necessidade de estímulos táteis ou uma resposta de esquiva mais sutil que não foi detectada. O comportamento de emboscada para captura de isópodes e a rápida resposta de fuga diante de uma planária predadora parecem estratégias adequadas para capturar presas rápidas e escapar de predadores lentos. O conjunto de resultados evidencia a grande diversidade morfológica, ecológica e comportamental de planárias terrestres.