Resumen:
Esta pesquisa estuda a Comissão Nacional da Verdade (CNV), um acontecimento social, político e histórico que obedece aos requisitos necessários para ingressar no circuito midiático como um acontecimento jornalístico. A CNV é um acontecimento atual, impregnado de passado, carrega uma expectativa de futuro e que está inserido em um campo problemático constituído (QUERÉ), a ditadura civil-militar no Brasil. Ela existiu porque o Brasil sofreu um golpe civil-militar, em 1964 - este um macroacontecimento que se destaca na história política brasileira pelas marcas que imprime em trajetórias de vidas, individuais e coletivas. A CNV ocorre quase três décadas depois do fim da ditadura civil-militar brasileira e nasce envolta em uma disputa pela “palavra final” sobre a verdade histórica e a memória oficial que a sociedade brasileira deve ter do período ditatorial. Desde sua instalação, em 2012, a CNV remexeu o passado recente e mal resolvido do país, tirou as coisas do lugar e expôs as relações de poder existentes no cenário político brasileiro. O Brasil foi o último, entre os países latino-americanos que passaram por regimes ditatoriais, a criar uma comissão da verdade. Isso diz muito sobre o processo que envolve a justiça de transição no país. Assim, a cobertura e o enquadramento sobre o acontecimento Comissão Nacional da Verdade podem dizer do compromisso do jornalismo em contribuir com o fortalecimento e consolidação da democracia brasileira e, por consequência, com uma justiça de transição plena. O objetivo principal desta tese é entender quais são os sentidos produzidos e silenciados pelo discurso jornalístico sobre o acontecimento Comissão Nacional da Verdade e a ditadura civil-militar brasileira, passados mais de 50 anos do Golpe que depôs o presidente João Goulart. Neste sentido, para estudar a CNV, além de perspectivas teóricas sobre acontecimento, optou-se por utilizar como referencial teórico-metodológico a Análise de Discurso Francesa (AD), com ênfase no conceito de silenciamento (ORLANDI, 2007). Assim, foi constituído um corpus de textos publicados nos jornais Folha de São Paulo, O Estado de São Paulo e O Globo, que compreende a instalação, a entrega do relatório final e outros momentos de maior visibilidade da CNV. Os acontecimentos são relativos a uma sociedade, e pode-se afirmar que, ao analisar o acontecimento social e jornalístico Comissão Nacional da Verdade, além de evidenciar o seu significado para o processo democrático brasileiro, foi possível identificar quais são os principais sentidos que foram disputados, revisitados, que circularam, se destacaram, foram silenciados e/ou apagados sobre a ditadura civil-militar brasileira no discurso jornalístico dos jornais estudados. Entre os sentidos identificados, a disputa em torno da interpretação da Lei da Anistia, de 1979, e a necessidade ou não de sua revisão obtém destaque.