Resumo:
Esta dissertação de mestrado analisa a prática de perguntar com partículas negativas. Entendemos a prática de perguntar como um formato de pergunta com o qual se pode desempenhar diversas ações (pedir, convidar, oferecer etc.). O estudo realizado por Heritage (2002) sobre a prática de perguntar com partículas negativas na ação de solicitar informação revelou que essa prática é tratada pelos interagentes como mais assertiva, além de buscar concordância ou discordância, não as respostas ‘sim’ ou ‘não’. Descrevendo solicitações de informação também, Park (2008) evidenciou que o conhecimento de quem produz a ação está quase no mesmo patamar que o conhecimento demonstrado pelo interagente para quem se solicita a informação. Tendo em vista que esses estudos foram produzidos com o olhar para a língua inglesa e coreana, questionamos: qual sentido os interagentes atribuem para a prática de perguntar com partículas negativas no português brasileiro? É com base nessa lacuna que esta pesquisa é desenvolvida. Objetivamos descrever quais ações são desempenhadas através da prática de perguntar com partículas negativas, além de investigar a organização de preferência (POMERANTZ, 1984; POMERANTZ; HERITAGE, 2013) e cross-cutting preference (SCHEGLOFF, 2007) nas ações descritas. O aparato teórico-metodológico utilizado nesta dissertação é a Análise da Conversa de base etnometodológica (SACKS; SCHEGLOFF; JEFFERSON, 1974). Analisamos 20 práticas de perguntar de interações gravadas em áudio e vídeo durante exames de ecografia obstétrica e morfológica, ecocardiografia e consultas de aconselhamento genético. Os exames e consultas ocorrem em um setor que atende mulheres em gestação de médio ou alto risco de um hospital materno infantil do Sistema Único de Saúde (SUS), localizado no sul do Brasil. Os resultados da investigação apontam para dois níveis distintos em que a partícula negativa é relevante: o nível da proposição do turno de fala e o nível da ação da pergunta. Quando se trata do nível da proposição, a partícula negativa nega a proposição do turno, ou seja, nega algum fato ou situação. Nessas ocorrências, o interagente que produz a pergunta demonstra alto grau epistêmico. O nível de ação, por outro lado, está envolvido com a relevância da partícula negativa no curso da ação realizada e com a sequencialidade da interação, não é a negação de alguma proposição. Nesses excertos foi observado um conhecimento menor por parte de quem faz a pergunta. Também analisamos a prática de perguntar com a expressão “eu não vou”, em que se observou a preferência por uma segunda parte do par em formato negativo e a relação com alguma situação do futuro de quem produz o turno. Nas práticas de perguntar cuja ação é produzir um pedido, tornam-se relevantes a legitimidade em realizar o pedido e as contingências envolvidas em sua execução. Concluímos que a negação na prática de perguntar pode ser uma estratégia interacional importante, portanto ter conhecimento sobre essa estratégia pode servir para alcançar entendimento nas interações, não somente entre pacientes e médicos.