Resumen:
Esta pesquisa, de natureza interdisciplinar, convoca os estudos linguístico-enunciativos (BENVENISTE, 1989; 1995), filosóficos (RICOUER, 2007) e psicanalíticos (FREUD,1975; GARCIA-ROZA, 1991; ROSSI, 2010), para produzir saberes sobre a especificidade do tempo e da memória na enunciação de adultos com mais de 60 anos. Para tanto, busca analisar de que modo a pessoa que fala se torna sujeito no discurso; entender como a instauração do outro (tu imediato) / Outro (cultura) contribui para o processo de subjetivação; examinar como a experiência do tempo se materializa na discursivização da ação do homem na linguagem e descrever a forma como a memória e a repetição tomam lugar no discurso (e na vida) de alguém que envelhece. A fundamentação teórica aprofunda três categorias que tomam lugar no discurso: sujeito, tempo e memória. O primeiro capítulo teórico (2) visa reconstruir, a partir de percurso de leitura sugerido por Flores (2013b), o conceito de sujeito da enunciação, derivado de parte de textos reunidos nos dois tomos dos Problemas de Linguística Geral, de Émile Benveniste (1989; 1995). O estudo aponta para a complexidade da construção dessa noção, atrelada a conceitos como os de homem, pessoa, locutor, subjetividade, intersubjetividade. O segundo capítulo teórico (3) apresenta a categoria tempo como elemento da construção de uma experiência na linguagem. Retoma algumas definições de tempo – físico, psicológico, cronológico, histórico, ficcional e linguístico, com base em Agostinho (1948), Alves (2008), Fiorin (2010), Mucida (2012), Bakhtin (2010) e Benveniste (1989; 1995), e aprofunda o conceito de tempo linguístico, ligado ao presente, o tempo do discurso. O terceiro capítulo teórico (4) explora a memória não sob a perspectiva biológica ou neurofisiológica, mas sob o viés filosófico e psicanalítico, com base em estudos de Ricouer (2007), Freud (1975), Garcia-Roza (1991) e Rossi (2010), a fim de pensar a respeito da memória sob o aspecto da singularidade da enunciação evocada. A metodologia (capítulo 5) propõe uma análise de fatos enunciativos que marcam a experiência na linguagem de um casal com mais de 60 anos. As análises dessa experiência revelam que a emergência do passado no discurso pode significar o atendimento a uma condição subjetiva que confere, para quem fala, o próprio sentido de existência, já que só existe sujeito na linguagem. Assim, a memória dá ao sujeito uma possibilidade de viver o tempo em uma dupla dimensão: no aqui-agora e na recorrência ao passado. Desse modo, não pode ser associada a um efeito natural do envelhecimento, pois constitui o sujeito, independentemente da idade. Espera-se contribuir para que os resultados alcançados possam abrir espaço para a expansão da linguística, especialmente dos estudos enunciativos, e para a ampliação da compreensão da dimensão subjetiva constitutiva da atividade linguística implicada nas interações sociais que envolvem o sujeito.