Abstract:
Nosso propósito principal neste trabalho é mostrar que o método utilizado por Aristóteles em sua biologia é o dialético. A demonstração não é o método da biologia por várias razões, entre elas porque os organismos e suas partes podem ser de outro modo do que são; além de o próprio Aristóteles ter afirmado que a precisão da matemática (demonstração) não deve ser exigida senão para as coisas não materiais. Sendo os animais investigados por meio da dialética, excetuados os princípios de cada área, apenas podemos ter opiniões confiáveis (endoxa) sobre eles, obtidos por meio de conceitos, métodos e argumentos, como propostos na Topica. Na biologia, Aristóteles parte dos endoxa, ou, quando esses não estão disponíveis, de suas próprias observações dos phainomena. Depois da compilação, Aristóteles os contrasta, observa ele mesmo os phainomena, contrasta os endoxa entre si, e também com seus próprios achados, elimina os problemas, tenta compatibilizar as opiniões e finalmente conclui. Quando não há endoxon anterior, Aristóteles contrasta os dados advindos de suas repetidas observações, que se constituem em verdadeiros experimentos.Na biologia, os principais conceitos são os de comparação, semelhança, diferença, e mais ou menos, os quais contribuíram com o desenvolvimento de outros conceitos, inclusive os de identidade e analogia. As partes dos animais investigadas são comparadas, e depois consideradas semelhantes ou diferentes. Se forem semelhantes podem sê-lo na morfologia, podendo ser então morfologicamente idênticas; ou apenas funcionalmente análogas. Esses conceitos são também importantes para a distinção dos predicáveis, inclusive seus topoi. O método dialético inclui vários procedimentos, entre eles os métodos comparativo, empírico e descritivo, bem como os argumentos indutivo e dialéticos propriamente ditos. Na biologia, a identidade não é em número, mas em gênero e em espécie. Graças a esses conceitos, Aristóteles formulou vários princípios, decisivos para o desenvolvimento do conceito de grupo natural, entre eles, o plano geral de construção corporal (plano corporal, arquétipo, Bauplan), princípio de correlação das partes, e a lei da embriologia segundo a qual os atributos do grupo aparecem antes daqueles da espécie, durante o desenvolvimento. Reconhecidos os grupos naturais, Aristóteles já dispunha de uma taxonomia, onde ele não dá prioridade à função com tem sido sugerido, mas antes enfatiza a morfologia. Também não é verdade que Aristóteles não distinga perfeitamente as homologias(identidades) das analogias. O que se dá é que, eventualmente, o que se considera hoje como homologia, Aristóteles (equivocadamente) considera como analogia, e vice-versa. Aristóteles foi quem pela primeira vez utilizou o conceito de analogia na investigação da Natureza, para indicar semelhança em funções (ou propriedades). Diferentemente das identidades, utilizadas até a identificação a nível específico, as analogias apenas permitem discriminar os gêneros. Exceto pelo gênero e pela espécie, que são eternalizados pela forma, a biologia não é conhecimento necessariamente verdadeiro para Aristóteles. Em relação às causas, na biologia elas parecem mais evidentes do que em outras áreas da investigação de Aristóteles. As causas formal e final têm relação com a função dos órgãos e de suas partes; de modo que o que se chama de teleologia na biologia é realmente o que entendemos hoje por fisiologia. Matéria, com o sentido de gênero, é a matéria relativamente indeterminada, mas com potencial para ser determinada pela forma. A causa eficiente de todas as vísceras é o coração, que é lógica e temporalmente anterior às demais. A maior contribuição de Aristóteles para a biologia não foi o conteúdo empírico de suas obras, mas sim o desenvolvimento dos diferentes conceitos e métodos para serem aplicados na biologia. Alguns desses métodos são utilizados em inúmeras áreas de investigação até hoje, como é o caso do método comparativo. A biologia e a metodologia nela aplicada por Aristóteles têm inúmeras semelhanças com a biologia atual, desde o histórico (compilação dos endoxa) até a conclusão. A biologia de Aristóteles tem uma íntima relação com sua filosofia, principalmente em relação à matéria e forma, à teoria das causas e à teoria do ato e potência. Durante o desenvolvimento embrionário há uma progressiva atualização da forma, do ovo e o embrião, até o indivíduo adulto, quando o animal está então apto a reproduzir, o que é a atualização completa de seu potencial como ser.