Abstract:
O presente trabalho visa a estabelecer as bases para a construção, a partir da obra de Ronald Dworkin, das premissas de uma teoria democrática da decisão jurídica que seja adequada para o Brasil. A ideia é identificar e discutir algumas das principais teses e hipóteses do jusfilósofo norte-americano, propondo uma apropriação de seus conceitos interpretativosno contexto da experiência constitucional brasileira. Para tanto, promove-se inicialmente uma discussão sobre o seu conceito de democracia (partnership conception) e sobre a sua concepção de revisão judicial da legislação (judicial review). A decisão jurídica é apresentada como uma questão de democracia, ideia que é defendida por meio de um contraste com o pensamento de Jürgen Habermas e Jeremy Waldron, e de uma aproximação com a perspectiva adotada, no Brasil, por Lenio Streck. Por meio de uma análise teórica e filosófica do debate Hart/Dworkin, são defendidas as seguintes premissas: a) a tarefa central da teoria jurídica contemporânea é normativa, no sentido de que deve fornecer critérios para a decisão; b) a verdade não é estranha ao domínio da Moral, sendo possível fazer juízos morais objetivos (há um debate, neste ponto, com o pensamento de Brian Leiter); e c) o Direito, desde um ponto de vista interpretativo, pode ser concebido como uma subdivisão da moralidade política, sem que isso prejudique a sua autonomia. O Direito é um conceito interpretativo e, no domínio da interpretação, são as ideias de responsabilidade e de valor que aproximam o argumento da verdade. Defende-se, assim, a epistemologia da responsabilidade proposta por Dworkin: quando se adere a uma prática interpretativa (um gênero interpretativo), atribui-se a esta um propósito e assume-se a responsabilidade de promover aquele valor. Este argumento pode ser iluminado pela Hermenêutica Filosófica de Hans-Georg Gadamer, cujos pontos de contato com o interpretativismo dworkiniano são investigados. Transportadas estas ideias para o âmbito do Direito, passa-se a defender a estratégia de leitura moral (moral reading) de dispositivos constitucionais. De acordo com a leitura moral, as decisões jurídicas devem ser geradas por princípios. A interpretação construtiva da Constituição leva à tese de que uma decisão jurídica e democraticamente correta deve ter a sua legitimidade confirmada de dois modos: por um lado, deve ser produto de um procedimento constitucionalmente adequado, por meio do qual se garanta, aos interessados, aquilo que Dworkin chama de participação moral; por outro, a decisão deve estar fundamentada numa interpretação que, dirigida à integridade, honre a responsabilidade enquanto virtude. A isso demos o nome de dupla dimensão da resposta correta.