Resumen:
A predominância do paradigma neoliberal em diversas esferas da vida social gera, como uma de suas principais consequências, a mudança de objetivos dos processos educativos para o desenvolvimento de competências. Esta Tese mobiliza reflexões sobre como a noção de competências emerge na Educação, a partir de deslizamentos e transposições de outros ramos, por meio de um processo de escavação, levantamento de documentos, autores e obras potenciais. Nesse processo, questionam-se as relações de saber e de poder, para compreender como se constituiu historicamente esse conceito na Educação, em uma pesquisa documental de inspiração genealógica, em que os documentos são vistos como monumentos. Os objetivos da pesquisa foram: (1) construir a historicidade do conceito de competências, tecendo os sentidos que lhe são atribuídos por diferentes áreas do conhecimento; e (2) compreender a trama histórica de que emerge o conceito de competências na área da Educação, que se tornou uma questão central nas discussões educacionais. Elaborou-se o arcabouço teórico de modo a tramar, ao longo da análise propriamente dita, de que forma essas ideias podem ser fruto da propagação
e dos desdobramentos da Teoria do Capital Humano e da cultura do empreendedorismo na Educação, o que veio a se confirmar. Em um primeiro movimento, investigaram-se, a partir de uma pesquisa direta, documentos que se conectam ao tema, bem como autores e obras com potencial de convergência e de contribuição com esta Tese. No segundo movimento, utilizaram-se outros documentos, identificados a partir dos primeiros documentos levantados. Esses dois movimentos são as portas de entrada para a composição do corpus empírico. Nesse processo de escavação, o Relatório Delors (1996) apresenta-se como ponto de partida, pois, para que a lógica de competências aí estivesse colocada, foi necessário o estudo das décadas de 1950, 60 e 70, quando a Teoria do Capital Humano surge e tem desdobramentos. Construiu-se a trama a
partir de quatro marcos temporais: as décadas de 1950 e 1960, em que se analisam os
desdobramentos da Teoria do Capital Humano e da Sociedade de Aprendizagem na Educação, buscando-se a formação de determinado tipo de sujeito para determinado tipo de sociedade; a década de 1970, com o Relatório Aprender a Ser (1972), o movimento de superação de testes de inteligência e aptidão proposto, a avaliação da competência por McClelland (1973), e, ainda, as discussões sobre a superação do modelo da profissão e do modelo do posto de trabalho; a década de 1980, com a saída da crise econômica; a década de 1990, com a importância de Delors (1996) e a força que recebe a temática da competência, tornando-se central a educação com foco na formação de capital humano. É interessante observar que, desde o movimento da
Teoria da Orientação Profissional, que critica o uso pseudocientífico da noção de aptidão, do Relatório Aprender a Ser e das discussões realizadas por McClelland (1973), vai se desenhando uma noção de competências que acaba por reinscrever a relação com o conhecimento, ou seja, com o conteúdo propriamente dito.