Abstract:
Vivemos uma crise de afetividade. As relações tornam-se cada vez mais fragmentadas, atravessadas pela lógica da performance, da produtividade e da antecipação. À medida que a vida cotidiana se acelera, elementos das dimensões inter-relacionais e afetivas se desaceleram e, com eles, o desejo e a disponibilidade de se envolver com o outro. Essa fragilidade relacional, que também afeta a maneira como projetamos, atravessa com força os processos de design participativo, que muitas vezes se dizem coletivos, mas operam em formatos normativos, instrumentais e desatentos à espessura dos vínculos que sustentam o fazer com. É nesse contexto que esta dissertação propõe a intimidade como uma perspectiva sensível para compreender a qualidade das relações em processos de design. Intimidade aqui não é entendida como algo romântico ou privado, mas como fenômeno relacional que emerge do estar-com, da confiança construída no tempo, dos limites negociados, da escuta que não antecipa, da presença que se oferece. Ao reconhecer que os vínculos interpessoais influenciam de forma decisiva a potência dos processos colaborativos, esta pesquisa parte do pressuposto de que a intimidade pode operar como lente de leitura e também como ética relacional nos projetos em que o fazer é partilhado. O percurso metodológico combina três frentes: o aprofundamento teórico sobre a intimidade como experiência situada, a realização de entrevistas narrativas abertas com atuantes em práticas participativas e a construção de articulações entre teoria e experiência. A partir desse trajeto, foram formuladas dimensões conceituais que buscam sensibilizar o olhar para o fenômeno da intimidade, foram reunidas versões narrativas que expressam modos diversos de vivenciá-la, e por fim, foram criadas quatro lentes que integram esses saberes e oferecem uma nova perspectiva para pensar a participação em design. Essas lentes não visam permitir algum tipo de aplicação rígida, mas sim como campos de atenção que permitem reconhecer a profundidade dos vínculos que sustentam os processos cocriativos. Ao propor a intimidade como perspectiva, esta dissertação não pretende definir um novo modelo de participação, mas sim convocar o design a implicar-se nas relações que o constituem, abrindo espaço para o envolvimento ético com o outro, a suspensão de certezas, a escuta afetiva, a temporalidade relacional e a disponibilidade de se deixar transformar pelo encontro.