Resumo:
O bolsonarismo é um fenômeno alinhado com outros movimentos políticos de extrema direita que assolam o mundo nas primeiras décadas do século XXI. Utiliza-se de um arsenal de estratégias digitais em plataformas online, entre as quais estão a criação e difusão de memes de internet. Os super-heróis são um produto cultural associado a diversas mídias que tiveram sua popularidade acentuada por produções audiovisuais a partir do ano 2000. Estes personagens estão frequentemente relacionados com os memes produzidos pela extrema direita porque fazem circular sentidos relacionados com virilidade, poder e dominação. Os movimentos masculinistas relacionados com políticos extremistas se apoiam na circulação de conteúdos gerados por usuários que difundem as lógicas de supremacia masculina. Esta retórica induz violências físicas e simbólicas contra outras pessoas, especialmente mulheres e pessoas queer. Esta tese busca entender, a partir de memes, como o bolsonarismo se apropria de imagens de super-heróis com sentidos de masculinismo para estabelecer seus territórios semióticos. A análise aqui desenhada toma como base pressupostos teóricos que dão conta de explicar a dinâmica dos super-heróis, do bolsonarismo e das masculinidades na cultura, a partir de uma perspectiva da memética e da Semiótica da Cultura, de Iuri Lotman. A metodologia se propõe a desvendar as territorialidades semióticas desses memes, ou seja, compreender os espaços que seus sentidos ocupam dentro das semiosferas, os sistemas que formam a cultura. Esta pesquisa computou 400 memes políticos baseados em super-heróis colhidos através de mecanismos de busca na internet. Do total, 60% deles se utilizam de figuras ligadas ao bolsonarismo e Bolsonaro aparece em 52% dos memes. Também se apresentam mais como imagens diversas sem repetição de uma estrutura. Heróis nacionalistas como Superman e Capitão América são os mais utilizados. Contudo, o uso abundante de manifestações imagéticas de hipermasculinidade e de personagens de ação como Exterminador do Futuro e Rambo ultrapassam as fronteiras de definições super-heróicas comuns. Uma masculinidade de ostentação e de cumplicidade masculina foram mais associados ao bolsonarismo, enquanto a ostentação e os sentidos de homofobia e misoginia foram utilizados para retratar os opositores do movimento. Esse resultado tem reflexo no fato de que a masculinidade é um fator ligado à demonstração de poder e, ao apresentá-la de forma vexatória, associada com a homossexualidade ou a feminilidade, significa também inferiorizar seu alvo. Ressalta-se que essa prática não é algo restrito a extrema direita, mas algo a que a esquerda também recorre. As implicações da tese dão conta de que os sentidos do bolsonarismo e das masculinidades são trabalhados a partir de movimentos de tradução semióticas, que permitem o uso de diversas acepções e valores sobre imagens dos super-heróis. A intenção dos memes de se espalhar e reproduzir pelo maior número possível de mentes e espaços da internet e da cultura, como um vírus, é um fator importante para a disseminação dessas ideias. Dessa forma, acontece uma sobreposição de ambientes semióticos que provocam um superaquecimento nas semiosferas, promovendo um aprofundamento e desgaste nos sentidos de masculinidades que são buscados com mais intensidade, ódio e violência.