Abstract:
O Brasil tem enfrentado dois problemas simultâneos relacionados à saúde respiratória: os
incêndios florestais e a alta taxa de mortalidade devido à pandemia de COVID-19. A floresta amazônica é um dos biomas brasileiros que mais sofre com incêndios causados pelo desmatamento ilegal. Esses incêndios podem trazer doenças respiratórias associadas à poluição do ar, sendo o Estado do Pará no Brasil o mais afetado. A pandemia de COVID-19 associada à poluição do ar pode aumentar potencialmente as hospitalizações e mortes relacionadas a doenças respiratórias. Aqui, objetivamos avaliar a associação das ocorrências de incêndio com as taxas de mortalidade por COVID-19 e internações por doenças respiratórias gerais no Estado do Pará, Brasil. Empregamos a técnica de aprendizado de máquina denominada k-means para agrupamento de focos de incêndios, acompanhada do método cotovelo utilizado para identificar a quantidade ideal de clusters para o algoritmo k-means. Agrupamos 10 grupos de cidades no Estado do Pará onde selecionamos os clusters com maior e menor ocorrência de incêndios de
2015 a 2019. Em seguida, foi proposto um modelo Auto-regressivo Integrado de Média Móvel Exógena (ARIMAX) para estudar a correlação serial de internações por doenças respiratórias e suas associações com ocorrências de incêndio. Em relação à análise do COVID-19, calculamos o risco de mortalidade e seu nível de confiança considerando a razão da taxa de incidência trimestral nos clusters com a alta e baixa exposição a incêndios. Adicionalmente, identificamos nos dois agrupamentos de cidades que o IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) e PIB (Produto Interno Bruto) são semelhantes, porém possuem um comportamento diverso considerando as internações e incêndios florestais. A partir do modelo auto-regressivo e de média móvel (ARIMAX), foi possível mostrar que além da correlação da série temporal, as ocorrências de incêndios contribuem para o aumento das doenças respiratórias, com uma defasagem
observada de seis meses após os incêndios para o agrupamento com alta exposição aos incêndios. Um destaque que merece atenção diz respeito à relação entre ocorrências de incêndios e mortes. Historicamente, o risco de mortalidade por doenças respiratórias é maior (cerca do dobro) em regiões e períodos com alta exposição ao fogo do que naqueles com baixa exposição ao fogo. O mesmo padrão se mantém no período da pandemia de COVID-19, onde o risco de mortalidade por COVID-19 foi 80% maior na região e período com alta exposição a incêndios. O processo de tomada de decisão é um problema crítico principalmente quando envolve políticas de controle ambiental e de saúde. As políticas ambientais são muitas vezes mais rentáveis como medidas de saúde do que o uso de serviços de saúde pública. Isso destaca a importância da análise de dados para apoiar a tomada de decisão e identificar a população que necessita de
melhor infraestrutura devido a fatores ambientais históricos e ao conhecimento do risco à saúde associado. Os resultados sugerem que as ocorrências de incêndios contribuem para o aumento das internações por doenças respiratórias. A taxa de mortalidade relacionada ao COVID-19 foi maior no período com alta exposição a incêndios do que no período com baixa exposição a incêndios. As regiões com alta ocorrência de incêndios estão associadas a mais mortes por COVID-19, principalmente nos meses com maior número de incêndios.