Resumo:
No âmbito da Organização das Nações Unidas (ONU), o discurso de ódio tem sido entendido como formas de comunicação pejorativas ou discriminatórias dirigidas contra grupos sociais ou seus integrantes com base em fatores de identidade. Dentre as manifestações severas e proibidas, está a apologia ao ódio nacional, racial ou religioso que constitua incitação à discriminação, hostilidade ou violência, prevista no artigo 20 do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos. Para interpretar isso, a ONU adotou o Plano de Ação de Rabat, que inclui um teste de seis fatores para identificar discursos que configurem essa previsão. Apesar dos avanços, o Plano de Ação de Rabat apresenta déficits e limitadas compreensões sobre a relação entre discursos de ódio e as experiências materiais de vulnerabilidade dos grupos sociais alvos. A ONU inclusive já indica que esses discursos articulam expressões de inferiorização e desumanização, o que foi uma das estratégias utilizadas no colonialismo para legitimar a dominação do outro e é parte da colonialidade. Assim, o objetivo desta dissertação é analisar como a lógica da colonialidade se relaciona com as insuficiências do marco regulatório global para discurso de ódio da ONU (com foco no Plano de Ação de Rabat e no teste de seis fatores), distanciando esse mecanismo jurídico da proteção efetiva de grupos sociais minoritários. Para tanto, a pesquisa parte do entendimento de que os discursos de ódio seguem a lógica da colonialidade, e adota os referenciais teóricos pós-coloniais e descoloniais. A metodologia utilizada consiste nos métodos dedutivo, comparativo e com pesquisa bibliográfica e documentação indireta. Os resultados indicam que o ódio, a hostilidade e as limitações do direito à liberdade de expressão, têm sido interpretadas com menos ênfase em uma perspectiva material, refletindo a fundamentação convencional desse direito e o discurso eurocêntrico dos direitos humanos, baseados em premissas liberais e racionais-individualistas. Ambas ocultam as dimensões sociais e políticas do ódio e experiências históricas de subordinação de sujeitos mantidas pela lógica colonial moderna, inviabilizando a existência de mecanismos jurídicos eficazes para proteção de grupos sociais minoritários, o que requer reformulações interpretativas desde a descolonialidade.